Promulgada aos 25 de abril de 2011 e revisada em março de 2013, a Nova Lei Fundamental da república húngara destaca-se entre os documentos juspolíticos deste século debutante.
Transcorrido há pouco seu sétimo aniversário, o texto constituinte ainda desperta fascínio e furor entre estudiosos além-fronteiras. Para muitos, vem sendo a pedra angular de uma soberania persistente, que refulge singular no crepúsculo das nações e demarca o distinto compasso dos antigos satélites soviéticos da Cortina de Ferro, todos igualmente minados por russos e alemães ao largo do século findo. São países que redescobriram sua realidade comunitária e não parecem dispostos a acompanhar o suicídio do Estado-Nação estimulado a ocidente.
O espírito impresso pelos constituintes daquele notável enclave situado no Leste Europeu está ricamente bordado em seu preâmbulo. É um signo raro de consciência histórica para o tempo corrente -- algo digno dos sucessores de Santo Estêvão, e de tantas batalhas no limiar da civilização. Transcrevemo-lo em tradução inédita, quer por seu interesse como experimento jurídico de vanguarda, substancialmente alheio ao consenso social-democrata daquelas cartas marshalinas do pós-guerra -- estas, de uma assepsia padronizadora desenraizada, tornadas tipicamente europeias (tradição em que se inserira tardiamente a Constituição Brasileira de 1988) --, quer por sua particular poesia, também estranha aos atos legislativos de nossos dias.
“NÓS,
OS MEMBROS DA NAÇÃO HÚNGARA, nos primórdios do novo milênio, respondendo por
cada húngaro, assim proclamamos o que segue:
Orgulhamo-nos
por nosso rei Santo Estêvão ter edificado o Estado Húngaro sobre sólidos
fundamentos, fazendo de nosso país parte da Europa Cristã mil anos atrás.
Orgulhamo-nos
por nossos ancestrais, que lutaram pela sobrevivência, liberdade e
independência de nosso país.
Orgulhamo-nos
dos notáveis feitos intelectuais do povo húngaro.
Orgulhamo-nos
por nosso povo, ao longo dos séculos, haver defendido a Europa em incontáveis
batalhas e enriquecido os valores comuns europeus, com seu talento e sua
diligência.
Nós
reconhecemos o papel da Cristandade na preservação da nacionalidade. Nós
valorizamos as muitas tradições religiosas de nosso país.
Nós
prometemos preservar a unidade intelectual e espiritual de nossa nação,
dilacerada pelas tempestades do século passado.
Nós
proclamamos que as nacionalidades vivendo entre nós integram a comunidade
política húngara e são parte constituinte do Estado.
Comprometemo-nos
com a promoção e a proteção de nossa herança, nossa língua, nossa cultura; dos
idiomas e culturas das nacionalidades que habitam a Hungria, junto a todos os
bens de origem humana ou natural da Bacia dos Cárpatos. Responsabilizamo-nos
perante nossos descendentes. Portanto, devemos proteger os meios de vida das
gerações futuras, fazendo uso prudente de nossos recursos materiais,
intelectuais e naturais.
Acreditamos
que nossa cultura nacional é um rico contributo à diversidade da unidade
europeia.
Respeitamos
a liberdade e a cultura das demais nações. Nós nos empenharemos por cooperar
com cada nação do mundo.
Entendemos
que a existência do homem é baseada na dignidade humana.
Entendemos
que a liberdade individual só se completa pela cooperação de um com o outro.
Entendemos
que a família e a nação constituem o espaço principal da coexistência, e que os
valores fundantes de nossa coesão são a fidelidade, a fé e o amor.
Entendemos
que a força da comunidade e a honra de cada homem baseiam-se no trabalho, uma
conquista do engenho humano.
Entendemos
possuir um dever geral de solidariedade para com os vulneráveis e os pobres.
Entendemos
que o objetivo comum dos cidadãos e do Estado seja alcançar o patamar mais
elevado possível de bem-estar, segurança, ordem, justiça e liberdade.
Entendemos
que a democracia viabilize-se apenas onde o Estado sirva a seus cidadãos e
administre seus assuntos com equidade, sem parcialidades ou abusos.
Nós
honramos os feitos de nossa constituição histórica e honramos a Santa Coroa,
que incorpora a continuidade constitucional do Estado Húngaro e a unidade da
nação.
Nós
não reconhecemos a suspensão de nossa constituição histórica ocasionada por
ocupações estrangeiras. Não haverá prescrição para os crimes inumanos cometidos
contra a nação húngara e contra seus cidadãos sob as ditaturas nacional
socialista e comunista.
Nós
não reconhecemos a constituição comunista de 1949, pois foi ela a base de um
governo tirânico, portanto, a proclamamos inválida.
Nós
concordamos com os membros da primeira, livre Assembleia Nacional, que
proclamaram como sua deliberação inaugural o nascimento de nossa liberdade na
Revolução de 1956.
Nós
reportamos a restauração da autodeterminação de nosso país, perdida ao
décimo-nono dia de março de 1944, ao segundo dia de maio de 1990, quando foi
formado o primeiro órgão popular de representação livremente eleito.
Consideraremos tal data o começo da nova democracia de nosso país, e da ordem
constitucional.
Temos
que, após as décadas do século vinte, condutoras a um estado de decadência
moral, seja premente a necessidade de renovação espiritual e intelectual.
Confiamos
em um futuro moldado em união, e no empenho das mais novas gerações.
Acreditamos que nossos filhos e netos farão novamente grandiosa a Hungria, com
seu talento, sua persistência e sua fibra moral.
Nossa
Lei Fundamental há-de ser base de nosso ordenamento jurídico; uma aliança entre
húngaros do passado, do presente e do futuro. É ela uma moldura viva, que
expressa a vontade da nação e a forma pela qual desejamos viver.
Nós,
os cidadãos da Hungria, estamos prontos a fundar a ordem de nosso país sobre os
esforços comuns da nação.”
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