Quando queremos ser
elogiosos para com determinados modos, hábitos ou comportamentos que julgamos
dignos e belos, tendemos a dizê-los “civis”, ou “urbanos”. Falamos em “civilização”,
palavra com a mesma raiz de “cidade”, e é efetivamente essa a sua conotação
positiva: a compostura da cidade, contraposta ao arredio do campônio.
Talvez o antigo
romano, em sua urbe às margens do
Mediterrâneo, efetivamente fosse mais tratável que algum bruto barbarizado,
perdido na Floresta Negra. Talvez, pois o prêmio esperado por todo augusto
senador, cônsul ou procurador parecia ser o sonho arcadiano da villa, entre pomares e oliveiras, e não
a selvageria do Fórum até a senectude. Talvez o cortesão renascentista fosse
mais amistoso, a princípio, que um desconfiado pastorinho, ou um calejado servo
da gleba. O professor da Bologna medieval seguramente teria mais a dizer sobre
as artes e a verdade do que o mercenário suíço, embora talvez menos que o
monge, no claustro de Montecassino.
Mas em nosso tempo,
aparentemente em qualquer país, região ou clima, é nas pequenas comunidades de
interior, onde a agricultura ainda comunica a liturgia inescapável das leis
deixadas por mãos não-humanas; lá, onde a realidade constringe a vontade, que
amizade e solidariedade ainda se brindam. A megalópole, seja Nova Iorque, São
Francisco, Londres, São Paulo, Rio ou Pequim, barbariza. A selva de pedra
aliena. As lâminas de vidro dos arranha-céus arranham a face de Deus, e a essa
ilusão de ótica tremenda os homens, delirando onipotência, buscam se assemelhar.
Dilaceram, assim, eles também sua natureza — e a da sociedade com ela.
Leituras relacionadas:
- Nota musical;
- Babylon the Great is fallen: Gregory L. Copley on un-civilization (em inglês, por Thomas F. Bertonneau).
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