Semanas
atrás, o pleno do Supremo Tribunal Federal declarava inconstitucional o artigo
5º da Lei 12.034/2009, que assegurava aos eleitores o direito a conferir, in loco, se o voto por si digitado na
urna eletrônica efetivamente será contabilizado ao candidato escolhido, e não a
um outro qualquer. Cidadania é isto: a possibilidade de autenticar o exercício
do poder em ato. É o exato oposto à submissão geral perante uma elite tecnocrata,
um Mágico de Oz. A intervenção desmesurada da
Corte compele os brasileiros a confiar cegamente na retidão de um sistema
exclusivamente digital de cômputo de votos – sistema esse rapidamente acolhido
pelas prototiranias da vizinhança continental, enquanto rejeitado por todas as
democracias sólidas da Europa e da América do Norte, precipuamente por sua
imunidade intrínseca a qualquer forma de auditoria externa de seus resultados.
A mulher de César não parece honesta.
Pois agora, nem bem
passado um mês, já se encomenda a próxima incursão inescusável dos excelsos
magistrados constitucionais por sobre as regras eleitorais.
A sujeição completa dos direitos políticos mais elementares – direito a votar, direito a ser votado – ameaça consolidar-se. Os atuais mestres do Estado e do governo passarão a ter controle total sobre as vias de acesso à representação política, tudo mediante canetada judiciária, enquanto as oposições congressistas (se é que as há) seguem deitadas em berço esplêndido.
A sujeição completa dos direitos políticos mais elementares – direito a votar, direito a ser votado – ameaça consolidar-se. Os atuais mestres do Estado e do governo passarão a ter controle total sobre as vias de acesso à representação política, tudo mediante canetada judiciária, enquanto as oposições congressistas (se é que as há) seguem deitadas em berço esplêndido.
Trata-se de impor ao país, a despeito dos órgãos de
representação popular, uma opção de reforma sectária que, sabe-se de antemão,
beneficiará exclusivamente a dupla dos maiores partidos já estabelecidos, em
detrimento do envolvimento social nas campanhas eleitorais e na administração
pública. É – parafraseando Lampedusa – a mudança necessária para assegurar que
nada mais seja mudado.
"Tudo no Estado,
nada contra o Estado, nada fora do Estado" – Benito Mussolini e seus
muitos asseclas regozijam-se, encontrem-se eles em seus túmulos ou, como aponta
Jonah Goldberg ("Fascismo de Esquerda", Record, 2009), à frente das
muitas organizações estatais e paraestatais que, ora mais do que nunca, ditam a
chamada "opinião pública” aceitável aos áureos salões, “politicamente
correta".
Em lugar de se optar
por um modelo eleitoral efetivamente aberto ao controle e à participação
populares, no qual a cidadania fosse livre a contribuir, como, quando e se quisesse,
para as candidaturas de sua livre escolha e simpatia (o que se faria pela
desburocratização das doações, incentivando-se o aporte legal de recursos quer
por indivíduos, quer por suas associações), a canetada orquestrada entre o
evidentemente ocioso sindicato da advocacia (cooptado por uma agenda
político-partidária conhecida, como de praxe sucede aos sindicatos brasileiros)
e figuras do Supremo pretende infantilizar ainda mais a sociedade, amarrando
todos os meios de ação que não dependam da benemerência dos detentores do poder
político.
Concentração de poderes, infantilização social, onipotência estatal: sempre menor autonomia, sempre maior coerção. Até quando se insistirá no mesmo remédio, sem se reparar que a dose cavalar o transformou, há muito, no veneno que flagela o tecido social?
O financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais não se presta a qualquer agenda positiva. É eticamente indefensável taxar um negro para que financie a candidatura de um neonazista; o dono da mercearia a um leninista que promete expropriá-lo; o feliz proprietário de sua casa própria de periferia, a duras penas conquistada, a financiar quem promete duplicar seu IPTU. Somado ao sistema de listas fechadas, que integra a mesma agenda pseudorreformista, o modelo que impede a participação popular no processo pré-eleitoral fortalecerá ainda mais as burocracias partidárias e banirá a possibilidade de renovação.
De outra banda, a
ideia que avança no Supremo sequer arranha os esquemas de corrupção vigentes. O
caixa oficial tornar-se-á caixa dois; o que já o era, passará ao três. Nada de
novo sob o sol. Se as más práticas acaso forem, hoje, a exceção, a estupidez da
medida assegurará que perfaçam regra. Nenhum parlamentar alugado deixará de
sê-lo por pudicícia de receber mais por sob os panos, com o agravante de
complementá-lo, agora, com maiores verbas da Viúva – que deixarão de sustentar
policiamento, hospitais e escolas, para serem convertidas em remuneração a
marqueteiros, gráficas e achacadores.
Algo precisa ser
feito a respeito do sistema eleitoral brasileiro, é verdade. Mas o
financiamento estatal de campanhas privadas é, sob todos os aspectos, um erro.
Muda-se para pior. Afasta-se a sociedade dos candidatos, tornando-os
dependentes não mais de uma mínima inserção social, mas da própria máquina governamental
e das burocracias partidárias – e as malfadas corporações tampouco saem de
cena. Muito mais eficaz seria a redução dos custos de campanha pela opção por
uma metodologia eleitoral de voto distrital e governança parlamentar.
O financiamento privado
e aberto é, inclusive, meio bastante propício para traçar a plataforma real de
cada candidato. Veja quem me financia e, mui provavelmente, saberá as ideias
reais que moverão minhas ações. A onipresença de fundações estrangeiras junto a
organizações pró-estatismo e programas governistas em determinadas áreas, por
exemplo, sugere muito sobre a organicidade de suas plataformas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário